Maria Laura

Vai um cordel aí?

Posted on julho 22, 2007. Filed under: Literatura, Maria Laura |

O ritual de todos os ‘meios de ano’ se repetiu mais uma vez: fomos matutos e matutas por uma noite. Tiramos a camisa quadriculada do armário e os vestidos de chita, pintamos o roto e seguimos o caminho da roça. Mas antes das festividades acabarem, que tal tentar algo diferente? Deixemos também o nosso pensamento conhecer o sertão!

Com vocês: o cordel.

Cordel de São João – Gustavo Dourado

São João arrasta-pé:
Forró, fogueira, baião…
Xote, xaxado e quadrilha…
Foguete, bomba, balão…
Caruaru-Campina Grande: São João bom é no Sertão…

[…]

No são João hoje em dia:
Tudo está muito mudado…
Tem show e festa em clube:
Se perdeu o rebolado…
Saudade do ao João:
No terreiro e no roçado…

No São João de minha infância:
Não tinha eletricidade…
A luz era à luz da lua:
Tinha estrelicidade…
Do São João de menino:
Lembro e morro de saudade!

Esta poesia popular traz, em suas entrelinhas, muito da real expressão nordestina, podendo transportar aos nossos corações a angústia de um agricultor na seca; a esperança do retirante ou, e principalmente, a alegria de ser alguém que enxerga nas próprias mãos calejadas a prova do trabalho honesto que, se muitas vezes não alimenta o corpo, tranqüiliza a alma.

Como nordestina orgulhosa que sou, admito que talvez exista no meu falar um certo tom de “apropriação”, afinal não podemos esquecer que em outras regiões do Brasil existem pessoas que também se dedicam a esta arte. É que penso que a partir do momento em que você passa a ver alguma coisa como símbolo seu, você se sente no direito de tomar posse dela, e foi em nossa terra que o cordel ganhou forma.

Existe aí uma grande contradição que muitos não percebem: A literatura de cordel chegou ao Brasil e instalou-se no Nordeste, porque na época éramos ricos e abrigávamos a capital do país. Isso parece irônico quando notamos que, nos dias atuais, muitos dos cordelistas são semi-analfabetos e escrevem para mostrar o esquecimento dessa região.

“Apesar dos altos índices de analfabetismo, a popularização da literatura de cordel foi possível porque os poetas cordelistas contavam suas histórias nas feiras e praças, muitas vezes ao lado de músicos. Os folhetos eram pendurados em barbantes (daí o nome Cordel) ou amontoados no chão, despertando a atenção dos transeuntes. Cabe ressaltar que as feiras nordestinas eram verdadeiras festas para o povo do sertão, nas quais podiam, além de comprar e vender seus produtos, divertir-se e se inteirar dos assuntos políticos e sociais.”, afirma A.A de Mendonça em seu texto “A História da Literatura de Cordel”.

O fato é que o cordel não pode ser definido apenas como uma poesia narrativa impressa, pois ele é, acima de tudo, POPULAR. Então, independente de você ser um bom escritor ou não, nordestino ou não, leitor de cordéis ou não, você faz parte do povo, logo essa arte também é sua.

Então, que não apenas nessa época de São João, nós, citadinos e sertanejos, possamos colocar as nossas vidas lado a lado em um mesmo cordão: a LITERATURA DE CORDEL.

Comece agora:

Na internet

Folhetos de Cordel
http://www.ablc.com.br/publicacoes/public_cordel.htm

Academia Brasileira de Literatura de Cordel
http://www.ablc.com.br/

Manifesto a favor da literatura de cordel
http://paginas.terra.com.br/arte/cordel/ap13_manifesto.htm

Nas livrarias

Literatura de Cordel, Sebastião Vila Nova
Dicionário Brasileiro de Literatura de Cordel, ABLC
Vertentes & Evolução da Literatura de Cordel, Gonçalo F. da Silva

XIII Antologia Brasileira de Literatura de Cordel , ABLC 96 páginas À venda na ABLC pelo telefone (21) 2232-4801, na parte da tarde a R$10,. A promoção de 10 antologias por R$50, ainda está valendo.

*Texto de Sarah Coelho.
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OS HOMENS QUE SE CHAMAVAM SONHOS

Posted on julho 1, 2007. Filed under: Literatura, Maria Laura |

Mais do que qualidade musical, os meninos do cruzamento entre as esquinas Divinópolis e Paraizópolis, tinham muita poesia pra mostrar. Nos anos 70, enquanto Lô Borges e Beto Guedes devoravam discos dos The Beatles, Milton Nascimento e Fernando Brant se encontravam e mostravam ao Brasil, através de “Travessia”, com que voz Deus cantaria.

Direto de uma esquina qualquer em Belo Horizonte, entre goles de pinga e peladas na rua, jovens garotos ansiavam por conquistar os ouvidos e o coração do mundo. Nascia, no bucólico bairro de Santa Tereza, um Clube cheio de interesse por assuntos culturais e políticos e com disposição de privilegiar, nas letras, os temas sociais em detrimento do amor.

O nome do grupo, Clube da Esquina, veio do próprio local de encontro, um cruzamento entre as esquinas Divinópolis e Paraizópolis. Os garotos queriam fazer música, poesia e, naquele local, sentiam-se livres para se divertir, reunir os amigos, somar seus talentos e, mesmo que não fossem considerados pela mídia e por alguns estudiosos como movimento, os mineirinhos já estavam condenados a fazer a vida de muita gente mais harmoniosa com suas canções.

Eles sofreram influência do jazz, The Beatlhes, Bossa Nova, Choros, Folias de Reis, Toadas, Congos e Rock Progressivo. Mas, a consolidação de uma linguagem própria se firmou, em 1972,
com o lançamento do disco ‘Clube da Esquina’, assinado por Milton Nacimento e Lô Borges, contando com a participação em peso de todos os membros do grupo de amigos.

A grande força poética do movimento, vem, além do talento de seus integrantes, do quadro histórico em que ele surgiu – a Ditadura Militar – pois, optando por não travar uma luta frontal contra o regime, acabaram adotando uma postura mais poética, plantando girassóis metafóricos numa terra adubada com gás lacrimogêneo e censura.

Diferentemente da Jovem Guarda, o Clube manteve uma temática política presente, mas de forma subjetiva. As letras das canções, em geral, revelavam uma tendência a construções mais abstratas – como em ‘Um girassol da cor de seu vestido’ – com imagens e metáforas que talvez ficassem distantes de uma tradição poética da música brasileira da época. Nos poemas, nem sempre se podia tirar alguma moral ou mensagem. Sobre isso, Márcio Borges sintetizou um pensamento literário que pode ser estendido a outros poetas do grupo em suas letras: ‘Pelo menos não viessem me falar de mensagens… ‘Qual a mensagem dessa letra?’ Como se um poema pudesse funcionar como cabograma ou sinal de fumaça.’

Os garotos da esquina transformaram em poesia suas paixões juvenis e seus anseios por justiça social. Uniram poema e música numa só constelação. Embriagados pelos sons das três Américas, eles brindaram o hibridismo e a diversidade da Música Popular Brasileira com um talento sem igual.

Milton nos deu sua voz, Lô Borges o seu som genial. Fernando Brant, Ronaldo Bastos e Márcio Borges traduziram nas letras os nossos sentimentos. Cafi, com sua fotografia, registrou cada detalhe desta jornada. Beto Guedes doou seus acordes fantásticos. Eumir Deodato e Wagner Tiso reconstruíram formas narrativas completas em orquestrações majestosas. E o restante do Clube da Esquina embarcou com eles nessa ousadia, pois, lá, os que se chamavam homens também se chamavam sonhos. E sonhos não envelhecem!

Para saber mais: Os sonhos não envelhecem – Histórias do Clube da Esquina, Márcio Borges (Editora Geração Editorial; São Paulo; 3º edição; 358 páginas, 1996)

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